A MULHER NO MERCADO DE TRABALHO: UM DEPOIMENTO
Apresento este
texto em duas versões: a primeira é a original; a segunda, com muitos cortes, a
que adaptei para publicação, no Diário de Santa Maria, no Dia Internacional da
Mulher.
Amorosamente, Aliris
Março/2014
Primeira versão
Sempre me
surpreendem os resultados de pesquisas sobre o mercado de trabalho que
ressaltam marcantes diferenças entre homens e mulheres: estas afirmam que se
sentem discriminadas e com remuneração inferior àqueles. Tais conclusões sempre
me causam inquietação porque nunca senti, na pele, nenhuma discriminação ou
tive salário inferior a homens que desempenhavam as mesmas funções que eu. E é preciso lembrar que exerci atividades
profissionais ao longo de 36 anos, em diferentes latitudes deste nosso imenso
Brasil.
Acredito que
essa situação peculiar que vivi se explique, primeiramente, porque meu pai
nunca foi prepotente nem agressivo – muito pelo contrário, ele não era, dentro
de casa, o comandante da mulher ou das filhas. Não tive, já na infância, de me
colocar numa situação de defesa diante do masculino, de estar em constante
estado de alerta. Com certeza, trouxe da família as lições básicas de igualdade
e, obviamente, de dignidade e respeito.
Além disso,
porque sempre convivi com mulheres – a começar pela minha mãe – que foram
profissionais sérias e competentes, que nunca consideraram suas profissões como
secundárias ou se sentiram ameaçadas pela concorrência masculina. Entre essas
mulheres, destaco uma tia que, em 1952, tornou-se uma das primeiras vereadoras
brasileiras, com respeitado exercício durante três mandatos.
Outro fator
importante a considerar é que sou professora e, com minha formação, além de
exercer o magistério, fui também servidora pública na Justiça Federal. Na
atividade de professora – reconheço – exerci uma função tipicamente feminina,
embora o magistério superior não seja seara apenas de mulheres. Como servidora
pública, fui revisora de textos técnicos e jurídicos – tarefa, na maioria das
vezes, exercida atrás da cortina do grande palco. Nos bastidores, entretanto,
meu difícil trabalho de sugerir, discordar e até corrigir foi sempre muito bem
acatado.
A partir das
minhas vivências e com a profissão escolhida, parti para o mercado de trabalho,
não como mulher, mas como pessoa que não via desigualdades e, por isso, não se
colocava na posição defensiva, muito menos na de inferioridade em relação a
quem quer que fosse.
Por onde
passei, cumpri fielmente meus deveres profissionais e, em alguns casos, até os
excedi, bem como usufrui dos direitos inerentes aos cargos exercidos, sobretudo
os relativos à maternidade quando os filhos eram pequenos ou muito pequenos.
Acrescente-se
a isso o fato de eu ter com meu marido relações simétricas de pessoa para
pessoa e de ele ter sido um constante incentivador das minhas atividades e do
meu crescimento profissional. Ele foi pai na mesma medida em que eu fui mãe:
nunca tive de preencher lacunas. Dentro desse contexto, não precisei ensinar
para os meus filhos a igualdade entre homem e mulher: eles a aprenderam no
cotidiano familiar. E que essa lição
frutifique e possa, mesmo que em âmbito restrito, contribuir para uma vida mais
digna e harmoniosa e, consequentemente, para um mundo melhor e mais justo.
Mesmo com
tantas justificativas e argumentos próprios, as minhas inquietações não
cessaram. Foi, então, que conversei longamente com minha irmã Ana Lúcia,
engenheira civil, com 40 anos de profissão que, com imensa segurança, me disse
que, tal como eu, nunca sentiu nenhuma restrição a seu exercício profissional,
quer em seu escritório, que no canteiro de obras. Ouvi, ainda, a opinião das
minhas duas filhas – uma jornalista e repórter do maior grupo de comunicação do
país e a outra advogada da área criminal – que também me afirmaram nunca terem
encontrado nenhuma restrição profissional nem se sentido diminuídas ou
ameaçadas pelo fato de serem mulheres.
Então, no meu
“filosofar”, pensar, questionar, dialogar, voltar a “filosofar”, concluí que
essa falada discriminação à qual as mulheres se referem nada mais é do que uma
história, até certo ponto, mal contada ou, mais precisamente, mal sentida.
Ficaram
perguntas! Será que problemas enfrentados pelas mulheres no passado ainda as
perturbam? Será que dentro de muitas famílias a distinção entre filhos e filhas
é ainda fomentada?
Não sei... não
sei! Talvez a discriminação da mulher no mercado de trabalho seja uma questão
mais marcada em outros estratos sociais porque – preciso reconhecer – as minhas vivências, as da minha irmã e das
minhas filhas foram no mesmo patamar, ou seja, todas nós exercemos atividades
que exigem formação superior. Ou terá sido mais decisivo, para todas nós, o
fato de termos, desde a infância, vivido nossa condição de mulher sem nenhuma
diferença diante do masculino?
Como não tenho
resposta, apenas inquietação, fica a minha reflexão. Mas espero, sinceramente,
que meu testemunho sirva de reflexão tanto para homens como para mulheres e que
as que não tiveram, como eu, vivências familiares favoráveis superem essa
marcante lacuna e se coloquem, tanto na vida privada como no mercado de
trabalho, como seres humanos sem distinção de qualquer espécie.
Segunda versão
Embora
pesquisas revelem que as mulheres são discriminadas no mercado de trabalho,
nunca senti, na pele, tal discriminação. E é preciso lembrar que exerci
atividades profissionais ao longo de 36 anos, em diferentes latitudes deste
imenso Brasil.
Acredito que
essa situação peculiar que vivi se explica, especialmente, porque meu pai nunca
foi prepotente nem agressivo – muito pelo contrário, ele não era, dentro de
casa, o comandante da mulher ou das filhas. Não tive, já na infância, de me
colocar numa situação de defesa diante do masculino, de estar em constante
estado de alerta.
Além disso,
porque sempre convivi com mulheres – a começar pela minha mãe – que foram
profissionais sérias e competentes, que nunca consideraram suas profissões como
secundárias ou se sentiram ameaçadas pela concorrência masculina; e, também,
porque sou professora e, com minha formação, além de exercer o magistério, fui
também servidora pública na Justiça Federal. Na atividade de professora, exerci
uma função tipicamente feminina, embora o magistério superior não seja seara
apenas de mulheres. Como servidora pública, fui revisora de textos técnicos e
jurídicos – tarefa, na maioria das vezes, exercida atrás da cortina do grande
palco.Nos bastidores, entretanto, meu difícil trabalho de sugerir, discordar e
até corrigir foi sempre muito bem acatado.
A partir das
minhas vivências e com a profissão escolhida, parti para o mercado de trabalho,
não como mulher, mas como pessoa que não via desigualdades e, por isso, não se
colocava na posição defensiva, muito menos na de inferioridade em relação a
quem quer que fosse.
Por onde
passei, cumpri fielmente meus deveres profissionais e, em alguns casos, até os
excedi, bem como usufrui dos direitos inerentes aos cargos exercidos, sobretudo
os relativos à maternidade quando os filhos eram pequenos ou muito pequenos.
Acrescente-se
a isso o fato de eu ter com meu marido relações simétricas de pessoa para
pessoa e de ele ter sido um constante incentivador das minhas atividades e do
meu crescimento profissional. Assim, não precisei ensinar para os meus filhos a
igualdade entre homem e mulher: eles a aprenderam no cotidiano familiar. Que
essa lição frutifique e possa, mesmo que em âmbito restrito, contribuir para
uma vida mais digna e harmoniosa e, consequentemente, para um mundo melhor e
mais justo.
Espero,
sinceramente, que meu testemunho sirva de reflexão tanto para homens como para
mulheres e que as que não tiveram, como eu, vivências familiares favoráveis
superem essa marcante lacuna e se coloquem, tanto na vida privada como no mercado
de trabalho, como seres humanos sem distinção de qualquer espécie.