sexta-feira, 28 de fevereiro de 2020




MENSAGEM A MEUS FILHOS
(De Aliris para Junior, Raquel e Mauren)


Hoje, com 72 anos, ao fazer uma retrospectiva da minha vida, posso afirmar que meu saldo é positivo, tenho muitas dúvidas e pouquíssimas certezas, uma delas é que tenho mais passado do que futuro e, por isso, vivo o presente da melhor maneira que posso e, na medida do possível, só faço o que gosto.
Nesta já longa caminhada, em se tratando de família, sei o quanto elas mudam: chega gente nova que vai substituindo aqueles que já não estão mais entre nós, as uniões trazem pessoas que antes nem sabíamos que existiam e que logo se tornam também nossos familiares com lugares cativos em nossos corações.
A nossa família, como não poderia deixar de ser, não foge a essa regra e já apresenta novos contornos: gente nova, que nem é mais tão nova – Nonô, Dudu, Bebela e Rodrigo – mas também um fato que abalou todos nós. Esse fato exigiu que extrapolasse meus limites para enfrentar os novos e difíceis desafios. Sei que não apenas eu, mas cada um de vocês vem assumindo papéis que até então não lhes cabiam. Diante disso, sinto que estamos mais e mais unidos para que, juntos, possamos dar conta do que recebíamos pronto, sem preocupação, de forma tão natural que nem percebíamos o que estava subjacente. E, além disso, e principalmente, a dor de cada um de nós ao ver aquele facho de luz que guiava o nosso caminho se tornar, a cada dia, um pouco menos brilhante.
Agora, além do que já havia para fazer, estamos todos diante de uma nova missão: cuidar do nosso cuidador. E ele merece o melhor de cada um de nós, especialmente de mim, sua companheira de jornada há mais de 50 anos. Nesse nosso longo tempo de caminhada, aprendi a conhecê-lo “como a palma de minha mão”; sei o que está sentindo ou pensando apenas pelo olhar, respirar, caminhar.
Neste momento, sinto-me confortável com a herança ética, fraterna, amorosa e prática (não encontrei palavra melhor!) que foi legada a vocês. Cada um tem princípios para nortear sua vida, mas sinto-me no dever de sintetizar em cinco breves tópicos o que talvez vocês ainda não tenham se detido para pensar ou se são coisas que só entendemos com mais idade. Aliás, a idade nos ensina maravilhas!

Como seria bom que os filhos, quando muito jovens, ouvissem os pais. Com certeza, poupariam erros e sofrimentos inúteis, mas ninguém aprende senão com as próprias experiências.

Respeitar sempre o tempo do outro; cada um tem sua própria maturação.

Escolhas são individuais: o que é bom para um nem sempre serve para o outro.

É preciso amar aqueles que amamos sobretudo quando menos merecerem porque é quando mais precisam.

Bom seria se pudéssemos comprar a vida em grandes parcelas, mas só podemos comprar um pouco por dia. (João Cabral de Melo Neto, em citação livre.)

Espero que esta mensagem seja útil a vocês. Compartilhem com Nonô e Rodrigo; com Dudu e Bebela, no momento que julgarem oportuno, eles ainda são tão jovens...

Acredito, sem muita certeza, que tenha conseguido, ao longo da vida, expressar em atos o que hoje recomendo a vocês. Lembrem-se: eu antes de chegar à idade que hoje tenho, tive a idade de vocês e também passei pelas que vocês já passaram. É ... a vida, um eterno continuum!


                                               Amorosamente — outubro 2019