segunda-feira, 24 de março de 2014

A MULHER NO MERCADO DE TRABALHO: UM  DEPOIMENTO


Apresento este texto em duas versões: a primeira é a original; a segunda, com muitos cortes, a que adaptei para publicação, no Diário de Santa Maria, no Dia Internacional da Mulher.
Amorosamente, Aliris
Março/2014


Primeira versão


Sempre me surpreendem os resultados de pesquisas sobre o mercado de trabalho que ressaltam marcantes diferenças entre homens e mulheres: estas afirmam que se sentem discriminadas e com remuneração inferior àqueles. Tais conclusões sempre me causam inquietação porque nunca senti, na pele, nenhuma discriminação ou tive salário inferior a homens que desempenhavam as mesmas funções que eu.  E é preciso lembrar que exerci atividades profissionais ao longo de 36 anos, em diferentes latitudes deste nosso imenso Brasil.
Acredito que essa situação peculiar que vivi se explique, primeiramente, porque meu pai nunca foi prepotente nem agressivo – muito pelo contrário, ele não era, dentro de casa, o comandante da mulher ou das filhas. Não tive, já na infância, de me colocar numa situação de defesa diante do masculino, de estar em constante estado de alerta. Com certeza, trouxe da família as lições básicas de igualdade e, obviamente, de dignidade e respeito.
Além disso, porque sempre convivi com mulheres – a começar pela minha mãe – que foram profissionais sérias e competentes, que nunca consideraram suas profissões como secundárias ou se sentiram ameaçadas pela concorrência masculina. Entre essas mulheres, destaco uma tia que, em 1952, tornou-se uma das primeiras vereadoras brasileiras, com respeitado exercício durante três mandatos.
Outro fator importante a considerar é que sou professora e, com minha formação, além de exercer o magistério, fui também servidora pública na Justiça Federal. Na atividade de professora – reconheço – exerci uma função tipicamente feminina, embora o magistério superior não seja seara apenas de mulheres. Como servidora pública, fui revisora de textos técnicos e jurídicos – tarefa, na maioria das vezes, exercida atrás da cortina do grande palco. Nos bastidores, entretanto, meu difícil trabalho de sugerir, discordar e até corrigir foi sempre muito bem acatado.
A partir das minhas vivências e com a profissão escolhida, parti para o mercado de trabalho, não como mulher, mas como pessoa que não via desigualdades e, por isso, não se colocava na posição defensiva, muito menos na de inferioridade em relação a quem quer que fosse.
Por onde passei, cumpri fielmente meus deveres profissionais e, em alguns casos, até os excedi, bem como usufrui dos direitos inerentes aos cargos exercidos, sobretudo os relativos à maternidade quando os filhos eram pequenos ou muito pequenos.
Acrescente-se a isso o fato de eu ter com meu marido relações simétricas de pessoa para pessoa e de ele ter sido um constante incentivador das minhas atividades e do meu crescimento profissional. Ele foi pai na mesma medida em que eu fui mãe: nunca tive de preencher lacunas. Dentro desse contexto, não precisei ensinar para os meus filhos a igualdade entre homem e mulher: eles a aprenderam no cotidiano familiar.  E que essa lição frutifique e possa, mesmo que em âmbito restrito, contribuir para uma vida mais digna e harmoniosa e, consequentemente, para um mundo melhor e mais justo.
Mesmo com tantas justificativas e argumentos próprios, as minhas inquietações não cessaram. Foi, então, que conversei longamente com minha irmã Ana Lúcia, engenheira civil, com 40 anos de profissão que, com imensa segurança, me disse que, tal como eu, nunca sentiu nenhuma restrição a seu exercício profissional, quer em seu escritório, que no canteiro de obras. Ouvi, ainda, a opinião das minhas duas filhas – uma jornalista e repórter do maior grupo de comunicação do país e a outra advogada da área criminal – que também me afirmaram nunca terem encontrado nenhuma restrição profissional nem se sentido diminuídas ou ameaçadas pelo fato de serem mulheres.
Então, no meu “filosofar”, pensar, questionar, dialogar, voltar a “filosofar”, concluí que essa falada discriminação à qual as mulheres se referem nada mais é do que uma história, até certo ponto, mal contada ou, mais precisamente, mal sentida.
Ficaram perguntas! Será que problemas enfrentados pelas mulheres no passado ainda as perturbam? Será que dentro de muitas famílias a distinção entre filhos e filhas é ainda fomentada?
Não sei... não sei! Talvez a discriminação da mulher no mercado de trabalho seja uma questão mais marcada em outros estratos sociais porque – preciso reconhecer –  as minhas vivências, as da minha irmã e das minhas filhas foram no mesmo patamar, ou seja, todas nós exercemos atividades que exigem formação superior. Ou terá sido mais decisivo, para todas nós, o fato de termos, desde a infância, vivido nossa condição de mulher sem nenhuma diferença diante do masculino?
Como não tenho resposta, apenas inquietação, fica a minha reflexão. Mas espero, sinceramente, que meu testemunho sirva de reflexão tanto para homens como para mulheres e que as que não tiveram, como eu, vivências familiares favoráveis superem essa marcante lacuna e se coloquem, tanto na vida privada como no mercado de trabalho, como seres humanos sem distinção de qualquer espécie.

 




Segunda versão


Embora pesquisas revelem que as mulheres são discriminadas no mercado de trabalho, nunca senti, na pele, tal discriminação. E é preciso lembrar que exerci atividades profissionais ao longo de 36 anos, em diferentes latitudes deste imenso Brasil.
Acredito que essa situação peculiar que vivi se explica, especialmente, porque meu pai nunca foi prepotente nem agressivo – muito pelo contrário, ele não era, dentro de casa, o comandante da mulher ou das filhas. Não tive, já na infância, de me colocar numa situação de defesa diante do masculino, de estar em constante estado de alerta.
Além disso, porque sempre convivi com mulheres – a começar pela minha mãe – que foram profissionais sérias e competentes, que nunca consideraram suas profissões como secundárias ou se sentiram ameaçadas pela concorrência masculina; e, também, porque sou professora e, com minha formação, além de exercer o magistério, fui também servidora pública na Justiça Federal. Na atividade de professora, exerci uma função tipicamente feminina, embora o magistério superior não seja seara apenas de mulheres. Como servidora pública, fui revisora de textos técnicos e jurídicos – tarefa, na maioria das vezes, exercida atrás da cortina do grande palco.Nos bastidores, entretanto, meu difícil trabalho de sugerir, discordar e até corrigir foi sempre muito bem acatado.
A partir das minhas vivências e com a profissão escolhida, parti para o mercado de trabalho, não como mulher, mas como pessoa que não via desigualdades e, por isso, não se colocava na posição defensiva, muito menos na de inferioridade em relação a quem quer que fosse.
Por onde passei, cumpri fielmente meus deveres profissionais e, em alguns casos, até os excedi, bem como usufrui dos direitos inerentes aos cargos exercidos, sobretudo os relativos à maternidade quando os filhos eram pequenos ou muito pequenos.
Acrescente-se a isso o fato de eu ter com meu marido relações simétricas de pessoa para pessoa e de ele ter sido um constante incentivador das minhas atividades e do meu crescimento profissional. Assim, não precisei ensinar para os meus filhos a igualdade entre homem e mulher: eles a aprenderam no cotidiano familiar. Que essa lição frutifique e possa, mesmo que em âmbito restrito, contribuir para uma vida mais digna e harmoniosa e, consequentemente, para um mundo melhor e mais justo.
Espero, sinceramente, que meu testemunho sirva de reflexão tanto para homens como para mulheres e que as que não tiveram, como eu, vivências familiares favoráveis superem essa marcante lacuna e se coloquem, tanto na vida privada como no mercado de trabalho, como seres humanos sem distinção de qualquer espécie.